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Artigo de dom walmor

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Reciprocidade cidadã

O entrevero político-comercial provocado pelo governo dos Estados Unidos envolvendo o governo do Brasil, cria oportunidade para reflexões que remetem à cidadania dos brasileiros. A começar pela discussão técnico-comercial e a busca de solução política como reação ao chamado “tarifaço”, requerendo do governo brasileiro encaminhamento que respeite a soberania nacional, inegociável. Essa medida exige de todos os brasileiros lucidez política sobre a necessidade de uma reciprocidade cidadã, compreendendo a importância da democracia e seus desdobramentos em torno do bem comum. E também a esperada postura de apreço e respeito, interno e externo, à cultura de uma nação, seus valores, sua história e sua pujança em potencialidades diversas.

A questão político-comercial em curso é uma oportunidade de demonstrar, por meio da civilidade e diplomacia, que nenhuma nação pode ser grande em prejuízo das outras nações. Essa é uma oportunidade que ilumina conceitos e compreensões importantes no que diz respeito à cidadania, incluindo o apreço pela terra natal, livre da chamada síndrome de “vira-lata”, à convicção de que é prioritário trabalhar e implantar uma ordem social e político-econômica que efetive procedimentos e funcionamentos no âmbito da igualdade social. Essa compreensão exige de governantes e representantes do povo, construtores da sociedade pluralista, uma visão mais lúcida quanto à premência de uma sociedade com tecido igualitário, contribuindo para a construção de um país, que pode ser gigante na igualdade social como o é na natureza, cantada patrioticamente. A reciprocidade comercial nas relações, próprias desta dinâmica, precisa inspirar a reciprocidade cidadã.

Os desafios precisam ser enfrentados com galhardia e lucidez, prospectando um cenário que não apenas resolva a específica questão das tarifas comerciais em relações bilaterais internacionais. A crise está posta por motivação política, mas, ao mesmo tempo, remete a reflexões internas importantes para fortalecer temáticas que ainda fragilizam o conjunto da sociedade brasileira. Prioritariamente, pensar, não apenas no bem-estar de grupos de privilegiados, mas considerar, mais uma vez, a importância do fortalecimento da democracia, compreendendo seu alcance para além da liberdade ideológica das articulações político-partidárias. A democracia como bem maior na configuração do tecido social de uma nação inclui uma série de princípios e valores que devem ser respeitados para que, assim, instituições democráticas qualificadas possam garantir a consciência de pátria que ilumina o sentido e o alcance da reciprocidade cidadã. A oportunidade abre caminhos para que a reciprocidade cidadã cure e amenize as polarizações, de modo que as diferenças se tornem força num horizonte comum, aquele dos interesses pátrios, partindo sempre da aplicação e do zelo pela justiça, de tal modo que o cidadão que atente contra a inteireza da democracia, em qualquer nível ou intensidade, seja responsabilizado.

Há de vir a solução do entrevero por meio de discussão envolvendo o conjunto da sociedade brasileira. Ora, não basta que se defenda com diálogo a soberania nacional e o desenvolvimento econômico. O desafio se desdobra e incide sobre a consideração da qualidade do tecido social: a sociedade brasileira precisa reagir com reciprocidade cidadã. O respeito a ser exigido ao Brasil por parte de qualquer outra nação ou governos não esgota a luta deficitária na sociedade brasileira, no que diz respeito ao compromisso de ser nação soberana e sociedade justa, aquela que tem, nos seus funcionamentos e organizações, um intocável respeito pela dignidade transcendente da pessoa humana. Violências, exclusões, marginalização social e desigualdades gritam, pela voz dos pobres, sobre a necessidade de atenção. Isto significa que a configuração do tecido social de uma nação pauta-se pelo compromisso efetivo sobre a necessidade de se orientar os programas sociais, científicos e culturais para o bem de cada ser humano, preferencialmente, na consideração aos pobres. A soberania política de uma nação deve ser garantida e desdobrada nos direitos de cada cidadão por funcionamentos que fazem, progressivamente, desaparecer os cenários consolidados de exclusão, discriminações e preconceitos.

O momento instiga respostas adequadas aos atentados contra a inteireza da nação, não se restringindo aos impactos comerciais. A nação brasileira está desafiada a não se deixar levar por polarizações e manipulações políticas para trilhar o caminho da reciprocidade, alicerçada nas suas riquezas, potencialidades, valores e princípios ocupando no cenário mundial o lugar que merece e pode ocupar. Estão postas oportunidades para a participação de todos na vida comunitária como aspiração pessoal e também como pilastras dos ordenamentos democráticos.

As tarifas ajustadas devem garantir avanços comerciais como uma pedra no xadrez do desenvolvimento integral, espelhado na justiça, distanciado de manipulações políticas e interesses oligárquicos que ferem e sangram no desrespeito ao meio ambiente, com comprometimentos ecológicos gravíssimos, sem amplo debate participativo da sociedade no seu conjunto. A reciprocidade cidadã indica um compromisso de contribuição para o crescimento do Brasil, consolidando sua vocação e grande potencial. Que o princípio da reciprocidade cidadã abra caminhos de diálogos entre nações e ilumine uma nova e esperada compreensão no horizonte de todos os que operam o funcionamento do Brasil, particularmente pela superação dos cenários de miséria, respeito às instituições democráticas, cuidado com legislações facilitadoras de licenciamentos ambientais cruéis e devastadores, estendendo a defesa da soberania nacional ao bem-estar justo e digno de todos os seus cidadãos.

 

Dom Walmor Oliveira de Azevedo 
Arcebispo metropolitano de Belo Horizonte